Quando, em 2017, João Lourenço tomou posse como Presidente de Angola, gerou-se uma enorme expectativa. Com o fim do consulado de Eduardo dos Santos, vinha uma nova equipa que prometia progresso, combate à corrupção endémica, desenvolvimento, maior qualidade de vida.
Por Paulo de Morais (*)
É certo que Lourenço e o seu vice-presidente, Bornito de Sousa, pertenciam à nomenclatura que, com Dos Santos, tinha governado o país de forma corrupta e tinha afastado os angolanos dos caminhos do desenvolvimento. Mas, mais do que expectativa, foi a esperança que se instalou.
Antigos dissidentes foram chamados à área da governação económica, como Lopo do Nascimento ou Marcolino Moco. O próprio Rafael Marques, uma das vozes maiores do combate à corrupção em Angola, foi recebido pela nova Presidência. Houve notícias de repatriamento de capitais, os negócios da “princesa de Angola”, Isabel dos Santos, foram escrutinados pela Justiça. Havia alguns bons sinais.
Mas – há sempre um mas… – volvidos quase quatro anos, os resultados são desoladores. As perseguições da Justiça a antigos governantes foram afinal selectivas. Houve mesmo da parte de João Lourenço e Bornito de Sousa a preocupação de defender alguns dignitários do “ancien régime”.
Houve uma protecção inexplicável a Manuel Vicente, acusado pela Justiça portuguesa; o Governo de Angola, sem vergonha, patrocinou-o, nem que para tal tenha provocado um imbrincado incidente diplomático. É claro que, como os políticos portugueses se vergaram, os processos de Vicente foram resgatados e enviados para Luanda; e, com estes a cargo da Justiça angolana, Vicente goza de impunidade quase ilimitada.
A par da impunidade na Justiça, as notícias de violações de Direitos Humanos são preocupantes, em particular a actuação das forças públicas de segurança no massacre do Cafunfo que, até hoje, o poder vigente não condenou com a veemência exigida.
Ao mesmo tempo, o desenvolvimento de Angola continua sendo uma miragem. Nos indicadores de desenvolvimento das Nações Unidas (medido pelo Índice de Desenvolvimento Humano), Angola ocupava, segundo relatório recentemente divulgado, a posição 148, equivalente, mas ainda abaixo da que ocupava em 2017 (147).
Os números são desoladores. O desenvolvimento não chega aos angolanos, nem em matéria de rendimento, educação ou saúde. Até a esperança de vida à nascença viu reduzido o seu valor de 61,8 (em 2017) para 61,2 (em 2019).
Para quem assiste à governação de Lourenço-Bornito a partir de Portugal, não pode deixar de fazer um paralelo com a chamada “primavera Marcelista”, momento histórico que, em Portugal, precedeu o fim do regime colonial fascista.
Quando Marcelo Caetano tomou posse como chefe do governo português, em 1968, instalou-se uma esperança, anteviu-se a mudança, mas ao fim de cinco anos já se percebia que o regime mantinha as suas características. Pouco faltaria e, em Abril de 1974, só uma Revolução conseguia colocar um ponto final num regime apodrecido que não tinha sabido (ou sequer querido) regenerar-se.
Uma lição de História para os senhores Lourenço e Bornito. Uma lição primaveril, em Abril.
(*) Presidente da Frente Cívica